Na minha rua, a 25 de Junho, no pobre bairro do Guamá, tinham duas tevês, dois aparelhos apenas. Eles chegaram quase quinze anos depois da primeira transmissão brasileira propiciada pelo empreendedorismo de Assis Chateaubriand
A molecada ficou fascinada. Eu fiquei hipnotizado ao ponto de pular o muro do Grupo Escolar Frei Daniel para ir ao Quitandinha Bar assistir o Jim das Selvas, o Cabo Rusty e seu cão Rin-Tin-Tin, no Forte Apache.
A noite, nos pendurávamos na janela da dona Odair para assistir o programa de Flávio Cavalcante e o Telecatch Montila e ver, extasiados, as voadoras do Ted Boy Marino.
Minha avó, dona Maria, parteira, nascida em Aracaty, no Ceará, nunca entendeu como aquele homem do Jornal Nacional ou era o Repórter Esso? não sei bem, entrava naquele aparelhinho.
Para ela, assim como ela o via, o homem da televisão também podia ver a nossa sala e reparar que as minhas irmãs estavam só de calcinha e sem modos.
Brigava e mandava se vestir para ficar descente na frente do homem. Vovó, em sua cadeira de balanço, toda cheirosa, nem piscava, dava boa noite todas as noites ao homem do noticiário.
A TV era um sonho.
O seriado Terra de Gigantes, me ajudou, na minha inocência, explicar outro fenômeno da mídia da minha infância, o rádio.
Por muito tempo, me conformei em pensar que dentro do rádio de madeira que enfeitava nossa sala – pelo qual eu soube que estavam atrás de capturar um tal de Aurélio do Carmo, também foi através dele que ouvi a musiquinha Bigorrilho – viviam os homenzinhos que falavam e cantavam.
Só descobri a verdade quando meu irmão Paulo construiu um transmissor rústico e estreamos o nosso próprio programa de rádio, ouvido pela vizinhança, um sucesso.
Chamava-se Paulo Roberto Show e disputava com o Paulo Ronaldo Show, o tal que foi deputado cassado e apresentava o Barra Pesada da época chamado de A Patrulha da Cidade, programa, que junto com o som da sirena da Copala, acordavam nossos estômago para hora do almoço.
Porém, com medo dos militares pensarem que estávamos querendo pregar o comunismo e a contrarrevolução, fomos aconselhados pelo nosso pai, sindicalista dos rodoviários, a parar com a nossa programação e esquecer o nosso sonho de sermos dono da primeira rádio comunitária do Brasil.
Setenta anos da tevê no Brasil e agora, o que será daqui pra frente quando tivermos a popularização da internet das coisas?