
(artigo originalmente publicado no jornal O Liberal de 27/09/2020)
Na hora de inscrever as chapas com as quais pretendem disputar as cadeiras de vereadores para as Câmaras Municipais, a maioria dos partidos políticos, independentemente de cor e de ideologia, enfrentam o mesmo problema: convencer suas filiadas a concorrerem como candidatas para contribuir com a política de igualdade de gênero e cumprir a legislação eleitoral.
O Brasil, apesar de ter 51% de mulheres eleitoras, tem baixa representação feminina se comparado a outros países da América Latina, ocupando o terceiro lugar. Segundo dados da Inter-Parliamentary Union (IPU), é o 142º em número de mulheres no parlamento no mundo. Estudo conduzido pelo PNUD e pela ONU Mulheres sobre direitos políticos das mulheres coloca o Brasil em 9º lugar entre 11 países da América Latina
Em 2018, as mulheres ocuparam apenas 14,6% das cadeiras da Câmara dos Deputados. Foram 75 deputadas eleitas em um universo de 513 cadeiras em disputa. Nesse ano, o Pará, com 17 vagas, elegeu apenas uma parlamentar. Esse quadro deixa as mulheres à margem do processo de elaboração das políticas públicas.
A legislação eleitoral atribui aos partidos o dever de corrigir a exclusão histórica da baixa representação feminina na política e os obriga a reservar 30% das vagas de candidatos para atender outro gênero, o que, na prática, quer dizer, em bom português, que o percentual é para ser preenchido por mulheres.
No afã de cumprir a legislação e não perder candidaturas masculinas, algumas mulheres têm seus nomes colocados nas listas partidárias, dolosamente, apenas para constar. Mas também há casos de desistência frente às múltiplas barreiras culturais decorrentes de uma sociedade machista.
O esforço das mulheres não termina com o convencimento a uma candidatura e à inscrição eleitoral. Muitas candidatas, mesmo depois de terem seus registros homologados pela Justiça Eleitoral e receberem o percentual do Fundo Eleitoral, acabam desistindo ou não fazendo campanha, dada a dificuldade enorme em conciliar a vida privada com a carreira pública, sendo por isso consideradas candidatas laranja.
O universo da política no Brasil é excludente, assim como é excludente a própria sociedade. Impor aos partidos políticos a exclusiva responsabilidade de corrigir essa mazela esconde outros fatores que impedem o país de corrigir a baixa representação feminina na política.
A lei dos 30% deve continuar se impondo, não se deve arredar desse objetivo um só milímetro, ao contrário, devemos trabalhar para ultrapassá-lo, até chegarmos ao ideal e termos o mesmo percentual de representantes mulheres relativo ao número de eleitoras. Mas culpar ou encarregar apenas os partidos políticos e não buscar olhar para a pobreza e a desigualdade, como a revelada pela pandemia da Covid-19, nos fará amargar derrotas civilizatórias.
As mulheres conquistaram o direito ao voto no Brasil em 1932, há 88 anos. Desde então, o cenário da baixa representação feminina não se altera. Enquanto esse cenário não muda, o país segue necessitando de políticas públicas mais abrangentes em torno de questões que estejam relacionadas às pautas femininas.
Claro que os partidos devem seguir o esforço obrigatório de abrir suas portas à participação política feminina, mesmo sabendo que as pessoas, independentemente do gênero, rejeitam política em razão dos desgastes dessa atividade. O cidadão não vê razão para se filiar e poucos são os partidos que oferecem um ambiente de debate de causas coletivas. Uma reforma política profunda, mudando as regras do jogo para tornar o país maisdemocrático, é urgente.
Mas o esforço de vencer as barreiras históricas da desigualdade e da exclusão não deve ser apenas dos partidos. A sociedade, em seus vários espaços, precisa assumir seu papel de protagonizar as mudanças necessárias.
José Carlos Lima é advogado, consultor ambiental e presidente estadual do Partido Verde